Imagine você acordar de manhã sem noção de onde está. Alguma coisa parece familiar em relação aos lençóis de algodão, aos quadros na parede, às cortinas, mas você não consegue se situar. Minutos depois, você passa por essa mesma sensação, mas, dessa vez, você está em pé em frente à penteadeira, usando camiseta e calças jeans sem se lembrar de sequer ter dormido. É como se sua consciência perdesse um passado e um futuro, como um filme de animação em que cada quadro anterior é destruído.
Clive Wearing vive nesse presente eterno. O músico e musicologista britânico tem o pior caso de amnésia já registrado até hoje [fonte: Sacks (em inglês)]. Seus instantes de memória duram alguns segundos antes de ela se apagar num piscar de olhos e começar novamente. Provocada por um caso de encefalite (em inglês) por herpes, que infecta o cérebro e o incha, a amnésia de Wearing o deixou em um estado de despertar constante, em que cada beijo, conversa ou xícara de café é sua primeira vez. A encefalite destruiu a capacidade de Wearing de formar novas memórias, rompendo qualquer lembrança do passado recente.
Ao contrário da maioria dos casos de amnésia, onde memórias mais antigas são preservadas, boa parte da memória episódica de longo prazo de Wearing (relacionada a fatos e acontecimentos específicos) desapareceu. Sua coordenação motora e inteligência geral permanecem intactas; é a memória de usá-las que está desconectada. Por exemplo, Wearing ainda toca piano com habilidade, mas não lembra quando o faz, nem que música tocou.
As diferenças de sua memória fragmentada refletem a complexidade da amnésia e do cérebro humano. Wearing sempre se lembrou de sua esposa, Deborah, ainda que não conseguisse recordar o nome de seu compositor favorito, Lassus [fonte: Sacks (em inglês)]. Wearing consegue comentar alguns acontecimentos de sua vida, entretanto, às vezes, há dúvidas se as histórias são evocadas de sua memória ou de sua imaginação [fonte: Sacks (em inglês)].
Então, como a amnésia apagou a memória de Wearing? E ter uma memória perfeita é assim tão bom? Vá para a próxima página para descobrir os caminhos da memória e passear por eles.
Causas da amnésia
A amnésia dissociativa se divide em duas categorias principais com base na extensão da perda de memória. A amnésia dissociativa global afeta as informações autobiográficas obtidas durante um longo período, enquanto a amnésia dissociativa circunstancial envolve as memórias de acontecimentos traumáticos específicos, como um acidente de carro ou um crime violento. Os dois são conseqüência dos efeitos de estresse extremo no cérebro.
O estresse intenso e prolongado pode levar à amnésia dissociativa, pois ele ativa as glândulas supra-renais, que liberam cortisol e outros hormônios na corrente sangüínea. O cortisol, em particular, reduz a plasticidade do cérebro, ou sua capacidade de mudar de forma a fim de criar novas vias nervosas durante a formação da memória. A exposição prolongada ao cortisol pode afetar negativamente o hipocampo [fonte: Instituto Canadense de Neurociência, Saúde Mental e Dependência (em inglês)]. Fica mais difícil criar memórias com um hipocampo debilitado, o que pode produzir amnésia dissociativa no ponto máximo do estresse.
Por exemplo, uma mulher anda pelo hospital confusa e agindo como se tivesse perdido completamente sua identidade. Em questão de dias, algo ativa sua memória. Talvez tenha visto algo no noticiário sobre sua cidade natal ou ouvido alguém dizer o nome de sua filha. A partir daí, ela rapidamente passa a se lembrar de quem é e se recupera daquele comportamento estranho.
Embora muito raro, essa mulher provavelmente estava sofrendo de amnésia dissociativa global, levando a um estado de fuga, ou período de perambulação. Esse tipo de amnésia, que trata da perda de todas as informações autobiográficas e identidade, é bastante grave porque a maioria dos pacientes apresenta problemas mentais, o que piora os efeitos do trauma psicológico sofrido. Normalmente, essas pessoas tinham depressão prolongada e uma lesão cerebral anterior, assim como ataques epilépticos ou uma lesão na cabeça através de uma região maior do cérebro. Por essa razão, o trauma pode ter um impacto maior e mais predominante no cérebro.
Fonte: http://saude.hsw.uol.com.br/amnesia3.htm

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